Saudações caros leitores. A ideia do artigo de hoje é esclarecer algumas perguntas e comentários sobre o livro e a repercussão de alguns trechos que criaram algumas polêmicas. Penso que tais dúvidas podem ser esclarecidas diante de uma única pergunta: afinal, Ctônio é um livro violento? Devo dizer que não existe uma resposta muito fácil. Isso não significa que seja simples e, que a resposta é objetiva.
Primeiro, é importante diferenciar os termos. Uma boa sugestão seria, deixar claro que violência em si, pura e simples, gratuita e sem objetivos, poderia ser, sim, um indício de que a obra carrega tais elementos. Todavia, este, não é o caso, pois, entendo que o termos que mais se encaixa neste contexto é: virulento. É tácito isso na leitura. Se, ser virulenta é um objetivo, ou uma consequência, então eu digo que sim.
Ctônio não é para leitores amadores, não é um livro de autoajuda, tem muito mais a ver com um resgate, uma episódica confissão. E, como toda boa confissão, traz nuanças ricas e particulares, em especial, as memórias do deus da morte. É nítido que a obra não tem aqueles típicos pudores de moral seletiva que se preocupam em contentar um número de leitores difusos e de pouca personalidade. Logo, Thanatos, como já afirmei em outros textos, não é flor que cheire.
Entendo aqui, ou melhor, na obra, que o termo virulência, seja mais adequado. Ele responde a um conjunto mais amplo e complexo de detalhes. Ainda mais quando se trata de resgatar mitos de um passado longínquo que ainda carregam muito mistério e enormes símbolos a serem retomados. É virulento porque precisa responder mais ao seu caráter viral, sua sede de atemporalidade e seus diálogos cirúrgicos, os quais, devem provocar nos leitores um conjunto de sensações diante das escolhas, o destino e as carapaças que revestem a alma humana.
Segue com sua virulência poética, mas não se afoga em metáforas apenas, pelo contrário, as usa como gatilho para articular, ironia e cinismo. Sei que se alguns leitores tomarem tais mecanismos como "defeitos" e não como qualidades, correm sérios riscos de odiar e não compreender a obra, mas, quanto a isso, nada posso fazer, somente lamentar. Jamais pensei que escrevia para um público ideal, e é exatamente por isso que ele se torna tocante, já que é do tipo de livro que quando começa, as portas do inferno estão abertas, isso é proposital.
Desse modo, para os que exigem da leitura, um desafio, uma busca pelo insondável e um flerte com o inconsciente, posso afirmar que terão uma excelente experiência. A acidez com que tudo se desenrola é retocada pelos contornos de uma trama e uma cuidadosa metanarrativa, isso permite que cada gesto e intenção dos personagens seja mais que justificado. Ansiamos pelo desconhecido quando este nos afaga com certa dose de segurança, e essa tenacidade é escancarada no livro.
A dinâmica com que o sacarmo é dosado, ora repentino e descompromissado como um trem veloz, ora em gotas, faz das ironias um satírico mergulho prático, quase socrático. O tempero final fica a cargo dos retoques emprestados da psicanálise, a qual, cinge os dramas e une cada retalho desconexo de milênios de história, a um banquete de alternativas. Vai do pacto entre a morte e o leitor aos personagens periféricos que tentam sequestrar a atenção dos olhos que percorrem as páginas na tentativa de envenenar-lhes os espírito e causar furor e dúvida.
No fundo, tudo é verdade, uma verdade mentirosa que cada personagem conta, como se esta, fosse a sua versão das outras versões. É curioso, pois, a aparente falta de linearidade não causa desconforto, ao invés disso, sorrateiramente, causa a linearidade. Eis assim, aquilo tudo que é devido e não pode deixar de existir numa ficção, tal como um prólogo do fim, algo que só poderia descambar do gênio da morte. A morte na ficção, ainda é o jeito mais honesto de se espremer a laranja antiga que nasce nos pomares de um mundo que carece de verdades.
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